44. A Tentação da Força
fonte da foto: http://tecciencia.ufba.br/articles/0001/6691/censura-na-ditadura_1_.jpg
Em tempos cada vez mais transparentes
A natureza humana escancarada
Tendemos desesperadamente
A procurar soluções descontroladas
Para esconder e iludir mesmo pra gente
A natureza humana descarada
Emergindo inevitavelmente
Uma ideia perigosa e equivocada
De invocar antidemocraticamente
Uma gestão de força autorizada
Mas será que o ditador será inocente?
Ou só não terá suas falhas divulgadas?
Não é melhor continuarmos cientes
Da roubalheira generalizada?
Para tomarmos atitudes conscientes
Para acabar com condutas inadequadas
E um dia quem sabe finalmente
Ver a nossa política moralizada
A cada dia vejo com mais frequência pessoas
que tenho a mais alta estima defenderem que o Brasil precisa de um regime de
força, uma ditadura nem que fosse provisória, para colocar o país nos trilhos
da ordem e da decência.
Inconformados com a corrupção e a insegurança
pública, defendem que "na época da ditadura não havia tanta roubalheira de
dinheiro público, nem tampouco tamanha violência nas ruas".
Questionam, ainda, se realmente teria havido,
e na proporção que é alardeado, o cenário de torturas e arbitrariedade no
período mais recente de ditadura militar que o Brasil passou.
Realmente tenho ficado assustado com essas
manifestações de gente inteligente, educada, equilibrada, pacífica e
razoavelmente culta e bem informada.
Quando me deparo com opiniões como essas
consigo entender quando diziam que a classe média apoiou a ditadura militar de
1964.
Antes de mais nada, gosto de refletir com
aqueles que tendem a apoiar um regime ditatorial o seguinte: você torce por um
regime de força, partindo do pressuposto que este regime terá uma direção
política semelhante à sua. Mas se a orientação política do grupo ditador for de
encontro ao que você pensa?
Imagine por um instante a figura política que
você mais despreza se tornando ditador do país. Imagine suas decisões mais
equivocadas sem poderem ser atacadas no Congresso, pela imprensa, nas redes
sociais. Imagine a corrupção que hoje parece ser generalizada e desenfreada,
sem poder ser denunciada pelo Ministério Público e julgada pelo Judiciário.
Imagine uma medida tomada em desfavor de sua profissão sem poder ser
questionada pelo seu órgão de classe.
Enquanto para alguns pode parecer óbvio o que
se está debatendo acima, repito: tenho visto muita gente que considero coerente
tendente a defender um regime de força no Brasil. E talvez não estejamos tão
distante assim disso. Os movimentos populares que tiveram seu ápice em junho, se voltarem, podem descambar para uma instabilidade política imprevisível.
Vide o Egito recente (guardadas as devidas proporções).
Portanto, temos que lembrar que em cada
crítica que fazemos, não, decididamente não, nós não odiamos o Congresso.
Odiamos a grande maioria dos congressistas que ali estão. E que, com todas as
ressalvas que se pode fazer, foram eleitos legitimamente de forma democrática.
Mas o Congresso é a instituição mais bonita de uma democracia.
São os representantes do povo mais próximos do
poder do país que poderíamos ter. Garanto que você leitor já se deparou pessoalmente
com um deputado federal de seu estado, em um restaurante, no aeroporto, em sua
comunidade. Talvez até conheça alguém que conhece um deles. A mesma oportunidade em relação a um presidente da república é
infinitamente menor.
A democracia é uma porcaria, eu sei. Mas como
dizem, é o melhor modelo que se conseguiu chegar até hoje.
Sds,
Hugo
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